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Torrefação de madeira para fins energéticos

Atender a demanda energética de maneira sustentável se tornou um dos principais desafios do Século XXI. A matriz energética da maioria dos países ainda é muito dependente dos combustíveis de origem fóssil, fontes estas não renováveis e ambientalmente contestadas. Assim, novos estudos e investimentos visando desenvolver fontes alternativas de energia se tornam cada vez mais necessários.
Uma dessas alternativas é a madeira que, apesar do tradicional uso na forma de lenha para cocção de alimento e geração de calor, perdeu grande parte da sua representatividade nas ultimas décadas. Mesmo com as suas vantagens ambientais e de custo, a madeira não consegue voltar a ser competitiva no mercado energético devido a algumas características indesejáveis, tais como a baixa densidade energética, a alta umidade e a heterogeneidade física e química, que dificultam o seu uso direto para produção de energia.

Para mudar esse cenário, é preciso “repaginar” o uso da madeira, desenvolvendo técnicas de pré-tratamentos físicos, químicos, biológicos ou térmicos para melhorar as suas características energéticas. Uma dessas técnicas é a torrefação, que apesar de já ser conhecida há muito tempo, só começou a ser estudada de maneira mais aprofundada a partir da década de 1930 pelos franceses.
A torrefação é um tratamento térmico a seco realizado entre as temperaturas de 200 e 300 °C em ambiente com concentrações reduzidas de oxigênio. Aplicada em partículas ou cavacos de madeira, essa técnica degrada os constituintes menos energéticos do material, principalmente as hemiceluloses, e por consequência, concentra um produto final com maior densidade energética, além de maior homogeneidade, menor umidade e menor dureza. Entretanto, essa técnica ainda não é totalmente dominada necessitando, dentre outras coisas, encontrar as faixas ideais de temperatura para o processo, fator fundamental na qualidade da madeira torrificada.

Nesse contexto, o Laboratório de Painéis e Energia da Madeira, vinculado a Universidade Federal de Viçosa juntamente com a Embrapa Floresta, desenvolveram uma pesquisa visando avaliar o efeito da temperatura de torrefação nas propriedades energéticas na madeira de Eucalyptus sp. No procedimento experimental, utilizou-se um torrefador rotatório com aquecimento a gás GLP, empregando-se quatro tratamentos com três repetições constituídos por partículas de madeira não torrificadas e partículas torrificadas nas temperaturas de 170, 220 e 260 °C.

Posteriormente, procederam-se com as análises química, física e térmica das partículas. Os resultados foram comparados entre si através da ANOVA e do teste Tukey com 95% de probabilidade.

Verificou-se efeito significativo nas propriedades da madeira com o aumento de temperatura de torrefação. Comparando a madeira in natura (não torrificada) com a madeira torrificada a 260 °C, observaram-se aumentos no teor de carbono elementar de 47,4 para 54,1%, no teor de lignina de 32,7 para 52,2%, no poder calorífico superior de 4465 para 4945 kcal/kg, na densidade a granel de 239,1 para 396,0 kg/m³, na densidade energética de 882 para 1727 Mcal/m³ e redução na umidade de equilíbrio higroscópico de 12,27 para 5,69%.
Todas essas mudanças nas propriedades das partículas de madeira são vantajosas quando a finalidade é a produção de energia.
A torrefação, ao degradar preferencialmente as hemiceluloses, concentra no material resultante os teores de lignina, constituinte estrutural da madeira com maiores proporções de carbono, por conseqüência, mais energético, e com características mais hidrofóbicas e menos biodegradáveis. Ao destruir parcialmente a estrutura fibrosa das partículas de madeira, a torrefação as deixa mais quebradiças. Isso faz com que o material torrificado tenha uma granulometria média inferior ao material in natura, facilitando uma melhor sobreposição das partículas, o que aumenta no final a densidade a granel do material.

Logo, pode-se afirmar que o tratamento térmico da madeira, denominado torrefação, apresenta um efeito positivo nas propriedades energéticas da madeira, podendo ser considerado um tratamento tecnicamente viável e com potencial de exploração. Ressalva-se que as tecnologias e os maquinários da torrefação ainda então em fase inicial de desenvolvimento, tendo como consequência ainda alguns barreiras econômicas e industriais.

Dentre as principais destinações do material torrificado estão a produção de pellets e briquetes, a gaseificação e a co-geração de energia. Espera-se que o interesse na torrefação de madeira aumente nos próximos anos em virtudes das vantagens por ela apresentada.

Tabela 1. Propriedades químicas e físicas das amostras de partículas de madeira não-torrificadas (controle) e de partículas torrificadas até as temperaturas finais de 170, 220 e 260 °C.
PROPRIEDADE Unidade Controle 170 °C 220 °C 260 °C
Teor de Carbono Elementar % 47,4 c 47,7 c 50,4 b 54,1 a

Teor de Lignina % 32,7 c 34,0 c 41,2 b 52,2 a
Umidade de Equílibrio Higroscópico % 12,3 a 9,2 b 6,5 c 5,7 d

Densidade a Granel kg/m³ 239 c 378 b 385 ab 396 a
Poder Calorífico Superior Kcal/kg 4465,0 d 4570,1 c 4772,7 b 4945,0 a

Densidade Energética Mcal/m³ 882 d 1440 c 1593 b 1727 a

Médias ao longo das linhas seguidas de mesma letra minúscula não diferem significativamente entre si pelo Teste de Tukey com 95% de probabilidade.


Por: Carlos Miguel Simões da Silva; Benedito Rocha Vital; Angélica de Cássia O. Carneiro e Mateus Magalhães

Fonte: Jornal Brasileiro das indústrias de Biomassa

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